Elena Ferrante – Um nome com mistério

“Já fiz o suf899604iciente por esta história. Escrevi-a.” O resto é privado. O nome Elena Ferrante começa e acaba nas páginas de cada um dos seus livros, a sua verdade é exclusivamente literária. Para lá disso, surge a lenda.

Nasceu em Nápoles há uns 60 anos. Por vezes, aparece uma data associada: 1943. Será mulher, terá sido mãe? É especulação, como tudo o que ultrapassa a literatura sempre que se fala de Elena Ferrante. Das poucas entrevistas que deu, todas por escrito e sempre intermediadas pelos editores italianos, foi-se sabendo que tem formação em literatura clássica, que gosta de Tchékhov, que viveu na Grécia. Numa dessas entrevistas, perguntaram-lhe porque escolheu não ser uma figura pública. “Talvez por qualquer desejo neurótico de intangibilidade”, respondeu. E ainda que o anonimato lhe permite maior liberdade, livra-a de qualquer espécie de auto-censura. “Escrever sabendo que não vou aparecer produz um espaço de absoluta liberdade criativa.” Talvez esteja aí a génese de uma escrita tão limpa quanto furiosa, “brutalmente honesta”, quase sempre sobre mulheres em situações limite, desapontadas, marcadas por um passado de que não se conseguem livrar, a viver momentos de paixão ou abandono; uma escrita capaz de descrever o asco que tantas vezes faz calar quem o sente e baseada numa premissa: a de que se a realidade permite a mentira, a escrita não.

A literatura é o compromisso exclusivo de Elena Ferrante. Tudo o resto é uma tentativa de construção de biografia que pertence à esfera do privado e tem como protagonista outro nome. Ao contrário dos grandes eremitas da literatura, Ferrante escolheu esconder-se na sua própria identidade. Não há um rosto, não há um nome. Apenas um pseudónimo que está a conquistar admiradores por todo o mundo depois de ter conseguido o respeito dos italianos desde que publicou o primeiro romance, L’Amore Molesto, em 1991. É desse momento a frase inicial deste texto: “Já fiz o suficiente por esta história. Escrevi-a.” Está numa carta dirigida aos seus editores sobre a promoção do livro que seria adaptado ao cinema por Mario Martone, em 1995. “Não pretendo fazer nada (…) que possa envolver qualquer compromisso público em que eu apareça pessoalmente.”

Vinte e quatro anos depois, com sete romances publicados –  o último uma série de que se espera este ano o quinto volume – e uma obra a ser traduzida um pouco por todos os continentes, Ferrante permanece tão privada quanto em 1991. “Não quero aceitar a ideia de uma vida em que o sucesso privado seja medido através do sucesso da página escrita”, lê-se na compilação de entrevistas, cartas e notas recentemente publicada em inglês pela Europa Editions, Fragments, Elena Ferrante on Writing, Readind and Anonimity, pequeno volume que tenta dar o retrato possível de uma autora com reputação em ascendente, com muitas páginas de críticas e artigos elogiosos publicadas nos suplementos literários de maior prestígio mundial. James Wood dedicou-lhe um extenso artigo na New Yorker, em 2013 que tem servido como uma espécie de carta de recomendação não oficial; o inglês The Guardian, além da crítica, tentou traçar-lhe o perfil e desmontar o mistério no final de 2014; na mesma altura, a escritora Lydia Davis escolheu o terceiro volume da série de Napóles como o melhor livro do ano de 2014 publicado nos EUA. O inglês The Independent fez a mesma escolha, como o Telegraphou o New York Times. São exemplos que ditam muito do que se passa no mercado mundial. […]

Isabel Lucas

http://www.publico.pt/culturaipsilon/noticia/elena-ferrante-este-nome-e-um-misterio-1683398

 

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