Caminhava em direção à escola, arrastando as solas dos sapatos desgastados pelo chão áspero e frio do inverno rigoroso, enquanto os pássaros entoavam os seus cânticos melancólicos. A minha face e braços eram cortados pelo vento álgido, à medida que o meu cabelo esvoaçava acolhido nos seus braços.
Após passar por várias ruas sinuosas e casas arranhadas pelo tempo, encontrava-me parada em frente a duas grandes portas metálicas que apontavam o caminho para o meu colégio.
Adentrando os portões, desviei os meus olhos para vários grupos de estudantes que ali se encontravam. Reparei essencialmente nos seus murmúrios abafados e nas suas gargalhadas extravagantes, nas conversas sobre moda das raparigas e nas discussões sobre os jogos da semana passada dos rapazes, nos olhares pesados e, ao mesmos tempo, distraídos que por vezes paravam em mim e nos que aparentavam estar perdidos naquele mar imenso de pessoas.
“Eu podia simplesmente juntar-me a um daqueles agrupamentos como qualquer outro aluno que acabou de chegar à escola nesta manhã serena. Mas eu não sou assim. Não consigo falar com ninguém, porque a minha ansiedade devora os meus pensamentos” , pensei.
Abandono rapidamente aquelas solitárias ideias e volto a focar a minha atenção nas aulas que terei naquele dia. Sento-me na minha secretária e pego num dos meus cadernos, onde começo a rabiscar algumas formas e faces até ouvir o toque para começar as aulas.
Com os alunos já todos sentados nos seus lugares, o professor entra com os seus passos pesados e sonoros, quebrando o silêncio profundo que se instalara naquela sala. Este para em frente da janela, observando no seu reflexo a sua barba mal feita, os seus cabelos desordenados e as enormes marcas roxas debaixo dos seus olhos vazios que mostravam as inúmeras horas passadas de madrugada a corrigir testes, até soltar um longo e reprimido suspiro que prendia na sua garganta há muito tempo.
“Bem meninos, hoje vão começar as apresentações. Espero que estejam preparados,” afirmou calmamente.
Ao ouvir tais palavras, baixei a cabeça, colocando-a entre os meus braços, pedindo entre rezas que eu não fosse escolhida, não porque eu não estivesse preparada, mas porque eu não aguentava os olhares acusadores de toda a turma parados sobre mim.
No entanto, as minhas preces não foram ouvidas, pois, segundos depois, o olhar ousado do professor encontrou-se com o meu, e este, com um disfarçado sorriso, sugeriu que fosse eu a primeira.
Levantei-me de cabeça ainda baixa e caminhei até ao centro da sala.
“Pode começar assim que estiver preparada,” avisou o professor.
As minhas pernas tremiam cada vez que um olhar ansioso, à espera que eu começasse, se encontrava com o meu desesperado. O bater na mesa de um lápis desinteressado marcava o ritmo acelerado do meu coração. As minhas bochechas ardiam mais com o tempo que passava, pintalgando a minha pele de porcelana com um tom avermelhado. Sentia que os murmúrios e os risinhos, abafados pelo rugido dos ventos que atacavam as janelas, eram dirigidos a mim e à minha maneira de ser, deixando-me mais ansiosa.
Tentando manter a calma, soltei três longos suspiros que encheram e sala e fechei os meus olhos cor de outono. Quando os abri de novo, senti-me subitamente mais serena e, mostrando o empenho que tinha dedicado àquele trabalho, apresentei-o com naturalidade.
Quando acabei, todos aplaudiram, e aqueles que eu antes temia, que criticavam cada gesto ou fala minha e me olhavam com os seus olhares devoradores e afiados, agora não passavam de um sentimento passado, um sentimento esquecido que sempre havia arruinado a minha oportunidade de ter um amigo, de te ter a ti.
Maria João Sousa, 9.ºD