A Fábrica de Palavras

 

Os alunos responderam, assim, ao desafio.

 

(…)

—  Olha, mãe, olha o que eu sei dizer, “abóbora”, “amora”!

 —  Muito bem! Já estão uns homenzinhos!

E tudo não passava desta alegria de cantarolar palavras, por vezes sem fazer a menor ideia do que elas significam, uma alegria tão inocente como a de quem sopra um dente-de-leão e vê, qual espetáculo de dóceis plumas esvoaçantes, um prazer tão momentâneo que leva a uma felicidade infinita.

Era um belo país. Os pássaros assobiavam melódicas notas musicais por entre os ramos da verdejante vegetação, que envolvia todos os recantos de palavreado florido. E eis o centro de tudo, o grande “dicionário fumegante” de onde brota a magia e se começa uma viagem enriquecedora, a grande fábrica.

As intrépidas crianças, animadas, brincavam nos jardins. Ou andavam à caça de palavras ou faziam jogos de quem sabia inventar as melhores histórias.

Os adultos, no entanto, viviam com medida e com cautela, trabalhando arduamente para que nada de mal acontecesse à fábrica, para que ela fluísse palavras, para que a magia nunca parasse, sendo a perseverança a principal característica deste conjunto social.

Bernardo Lello, 10.º Ano B

 

Num desses dias, em que o vento arrasta as palavras, o João, com uma alegria contagiante, correu para a rua com a sua rede, na ânsia de pronunciar pela primeira vez uma palavra. A primeira que “apanhou” deixou-o em êxtase. Uma lágrima surgiu-lhe no canto do olho. O tímido rapaz honraria finalmente a falecida mãe, com quem apenas falara por olhares e silêncio. Esta era a palavra que acabaria com a eterna tristeza que o assombrava.

Enquanto corria para casa, pensava no pai, homem de trabalhos pesados e escassas palavras, escadas demais para lhe preencher a alma. Pensava na mãe e nas noites que ela passava a chorar, temendo o futuro do filho. Quando se aproximou de um beco negro, com um odor repudiante, avistou um «sem-diálogo» à procura de expressões e, quase sem pensar, ofereceu-lhe o vocábulo, para seu delírio.

  — Obrigado — respondeu o pobre, cambaleando até desaparecer…

Paulo Carmona, 10.º Ano B

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