Personalizando as Palavras: o Doce Estilo Novo

img-20161206-wa0007

Uma conversa com Valter Hugo Mãe

Podemos dizer que qualquer feira do livro é um evento mágico que preenche facilmente um espaço vazio, principalmente aqueles que possam existir na vida interior de cada indivíduo, que por nada deste mundo parecem querer ser erradicados. Então, há somente uma coisa a fazer: partir em busca de novas ideias que nos libertem da prisão das horas, dos dias, das semanas, dos anos, da vida. Onde as encontramos? Nos livros, nos sonhos das outras pessoas, que se tornaram eternos marcos. E tudo à distância de umas escadas. Na semana de 21 a 25 de novembro de 2016, todos os alunos do Colégio Luso-Francês foram presenteados com um pouco de eternidade, também personificada nas palavras do escritor Valter Hugo Mãe, o representante das palavras daquele momento.

Valter Hugo Mãe recorre à pintura para ilustrar a escrita e, de certo modo, as palavras são as ilustrações das vivências, das salas que existem de uma forma diferente na vida real e no mundo imaginário. Isto revela a dificuldade em descrever com precisão um espaço, sem que nos tentemos com a passagem para o papel daquilo que o espaço é para nós, e não daquilo que é somente enquanto natureza. O mesmo se passa com a produção de um quadro: o artista arranja sempre maneira de se trair, mesmo sem intenção. Pelo facto de haver, tanto na pintura como na literatura, elementos únicos e inacessíveis na vida física, ambos os exercícios são únicos. É esse o adjetivo correto para o discurso e a analogia de Valter Hugo Mãe.

Tal como os pintores inventaram diferentes técnicas para exprimir variados sentimentos (através do tipo de pinceladas, da mistura de cores, das perspetivas, frontalidade, entre outros), como é que os escritores encontram novas maneiras de comunicar a sua arte? Principalmente nos dias que correm, nos quais a literatura parece uma cópia de obras de escritores antigos, serão todos os estilos de escrita o mesmo? Valter Hugo Mãe respondeu implicitamente a estas perguntas, pois, ao evitar a utilização da palavra «não» para ser fiel a uma ideia de boa educação oriental, ao não utilizar maiúsculas para acabar com as hierarquias que existem entre as palavras e interpretar à sua maneira o uso das vírgulas, criou a sua própria prosa, que é um rompimento com o tradicional exercício da escrita, ensinado a todos e da mesma forma. Tudo isto transmitiu originalidade e, talvez, introduzirá um novo movimento literário, em tudo diferente dos anteriores. Vi tudo isto como um ato de rebeldia face às regras elementares, e também uma tomada de posição de quem questionou aspetos básicos, que, de tão rotineiros, nos passam ao lado. Acima de tudo, fez-me pensar acerca de como tratamos as palavras: devemos ter cuidado com elas, torná-las o próprio fim e espelhar as ideias no mais insignificante vocábulo. Foi isso que Valter Hugo Mãe fez. Esta sua relação com as palavras advém, provavelmente, da poesia, o maior exercício de liberdade: nela, escolhendo a dedo as expressões, podemos ser o que quisermos, sendo que tudo é uma ideia, até as próprias palavras.

O dever de um escritor é passar uma boa mensagem às multidões. É insistir na importância de ter livros em casa, de saber apreciar obras de arte, de deixar de lado o ódio e a exaltação tão fácil de suceder aquando de uma discussão na qual nos entusiasmamos, na qual queremos a todo o custo persuadir e tornar diabólica a posição contrária. E para quê? Para sermos humanos. Para nos afirmarmos enquanto seres que pensam, mas razoáveis ao ponto de ouvir o outro em primeiro lugar. O importante será que os jovens deixem de se rebaixar com preferências de reduzida complexidade. Foi esse o sábio conselho dado por Valter Hugo Mãe.

Durante toda a palestra, pensei que estava a assistir a um programa de rádio, ou então frequentando qualquer lugar agradável, pois tudo se adequava: era um momento de lazer, longe de tudo o que oprime a alma. Principalmente por tudo ter decorrido num labirinto literário, isto é, numa sala cheia de livros de todos os géneros, dando a ideia de haver uma história destinada a cada aluno daquele auditório. O discurso espontâneo de Valter Hugo Mãe, a pilha de seis livros seus disposta sobre a mesa, os dois sofás vermelhos e confortáveis colocados só para a conversa, o copo com água meio cheio… Tudo estava feito para que todas as palavras fossem ouvidas atentamente. Valter Hugo Mãe falava, e os alunos ouviam. Eu ouvia, procurando uma ideia nova que acabei por encontrar.

A circunstância de se poder conversar abertamente com um artista é uma dádiva que tem em vista ensinar-nos a existir, e não apenas a sobreviver enquanto seres académicos forçados. A mesma revelou o verdadeiro ideal da educação, que é o saber pelo saber, procurando a versatilidade. Na minha opinião, fora esse um dos muitos significados da simples possibilidade de falar com Valter Hugo Mãe, naquela terça-feira fria, mas com um céu azul claro e nuvens brancas propícias ao sonho daquela tarde, uma tarde de inspiração.

Margarida Oliveira, 11.ºA

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *