Quimera

Em determinados momentos, parece que estamos quase a atingir este local… Já noutros, parece que nos afastamos anos-luz. Muitas lendas e mitos se criam à volta de Quimera. Todos os dias nos chegam teorias especulativas que visam explicar este fenómeno.

Dediquei-me durante vários meses a fazer uma pesquisa exaustiva, porque tudo o que podemos saber acerca deste lugar encontra-se em enciclopédias e livros antigos. Posso garantir-vos que Quimera esconde muito mais para além dos rumores que circulam e que os habitantes deste local vivem no sítio mais sublime e perfeito que poderia alguma vez projetar. Além de agora saber tudo ao pormenor sobre o comportamento social, leis e afins deste lugar, também compreendi o porquê de a distância que nos separa de Quimera alterar.

Nos livros, Quimera é apresentada como uma “espécie de ilha”, que se situa num contexto tectónico um pouco singular. Pode estar imóvel durante largos meses, como da noite para o dia se mover de uma forma considerável. Os registos apontam que, entre os anos de 1914 e 1918, a nossa sociedade se afastou cada vez mais de Quimera, como também, no dia 11 de setembro de 2001, se verificou um afastamento repentino.

Penso poder ser útil a muitos outros que também queiram compreender e descobrir um pouco mais sobre Quimera, já que me proponho a sistematizar todo aquele denso conteúdo que as enciclopédias e os livros que consultei contêm.

Primeiramente, devo dizer que esta “espécie de ilha” está dividida em dois grandes polos — Polo Natural e Polo Urbano —, sendo estritamente proibida a “contaminação” entre estas duas extremidades. No Polo Natural, ficam as habitações das 777 famílias que pertencem a Quimera. Polo sossegado, idílico, bucólico, onde apenas tem lugar a confraternização familiar, é, por isso, o local onde se criam as melhores memórias e onde se pode relaxar. O Polo Urbano está destinado à vida laboral e ao desenvolvimento académico das crianças e jovens. Todos os cidadãos trabalham na profissão para que mais aptidão possuem e esta característica da sociedade de Quimera evita que sejamos atendidos por “aquele profissional incompetente que nos aparece, precisamente, naquele dia em que estamos sem paciência”. Mas como se pode garantir que determinada profissão é a mais adequada ao perfil do indivíduo X? Pois bem, existe uma máquina que foi desenvolvida e que avalia, com o máximo rigor, as competências e preferências do jovem, depois de finalizar o percurso académico. Assim, além de se assegurar que teremos um profissional qualificado, também se garante que ele se sente realizado com a profissão que vai exercer. Retomando as valências do Polo Urbano, acrescento ainda que esta secção de Quimera também está destinada ao comércio e às atividades de lazer.

Os Quimerianos são pessoas com espírito crítico, pois esta capacidade é assegurada pelo sistema educativo desta ilha. Nas escolas, os estudantes não aprendem para que seja aferido o seu conhecimento num mero momento de avaliação, umas semanas depois. Aprendem, acima de tudo, porque são desde cedo consciencializados de que o conhecimento é a via do progresso e do desenvolvimento social. Deste modo, todos tentam tirar o máximo proveito da escolaridade, sendo escusados quaisquer testes que promovam a memorização momentânea de saberes. São dinamizadas palestras que abordam os temas mais significativos e atuais, bem como workshops e ateliês que promovem o espírito de equipa e responsabilidade.

Em Quimera, não há nenhum cidadão igual ao outro, mas existem algumas características, entre elas a empatia e o altruísmo, que todos possuem. Da mesma forma, também existem características que dificilmente estão patentes num Quimeriano, como a maldade e o egoísmo. Assim, raramente são registados casos de perversão moral… Porém, quando acontecem, existe uma pena eficaz para o pecador: um simulador que projeta no agressor os sentimentos causados na vítima. Este método evita que o pecado se repita e incute a empatia.

Várias páginas dos livros que consultei são dedicadas a explicar o sistema político, mas em nenhuma se faz referência ao nome. O poder está concentrado numa só pessoa, o que é exequível, já que apenas 777 famílias compõem Quimera. No entanto, confesso que esperava algo de inovador e questionei-me como poderia ser benéfico apenas uma pessoa deter o poder absoluto. Percebi, contudo, que já me tinha deparado com a resposta umas páginas antes… Aquela máquina, que averigua qual a profissão que vai mais ao encontro das preferências e competências do cidadão, dita quem será o presidente. Garante-se, então, que quem ocupa este cargo de tanta responsabilidade é a pessoa com mais aptidão para tal.

É realmente impressionante como é que uma sociedade consegue ter este nível de organização e cidadãos tão íntegros. Um dos pontos-chave para tal é o facto de a taxa de discriminação ser realmente reduzida. Por exemplo, todos os trabalhadores recebem o mesmo ordenado e é justo que tal aconteça. Afinal, se todos os cidadãos estão satisfeitos com a profissão que exercem, o grau de contribuição e de dedicação de cada um é semelhante. Assim, é legítimo que todos tenham o direito de receber a mesma quantia (777 quimos líquidos, que equivalem a 4500€). Sim, líquidos, porque uma pequena percentagem de cada ordenado, cerca de 3%, é depositada no cofre comunitário que se situa no Polo Urbano e, de 6 em 6 meses, se necessário, o presidente pode utilizar o montante para investir em alguma necessidade que contribua para o progresso de Quimera.

Há muitos outros tópicos que poderia aqui abordar, mas estaria a desviar-me do meu propósito: resumir todas as características desta ilha, que a fazem o lugar mais perfeito de todos. Quero apenas acrescentar um pequeno pormenor…. Aliás, um grande pormenor… Não, nem se pode denominar “pormenor” a informação com que vou concluir este artigo. Decidi deixá-la para o final, pois também eu apenas tive conhecimento dela na última página do último livro que consultei. E ainda bem que assim foi — fechei a minha pesquisa com chave de ouro. Há pouco, quando expus os registos que indiciavam que os maiores afastamentos entre a nossa sociedade e Quimera tinham ocorrido entre os anos de 1914 e 1918, bem como no dia 11 de setembro de 2001, não explicitei o porquê… Isto acontece devido ao efeito de dois “ímanes” que se encontram localizados numa zona bastante profunda da Terra: um por baixo de Quimera e o outro sob os restantes Continentes. Quando se verificam ações tão cruéis à escala mundial, a polaridade do nosso íman inverte, por isso afastamo-nos de Quimera, afastamo-nos da perfeição. Pelo contrário, se adotarmos os valores dos Quimerianos, esta ilha aproxima-se de nós, devido à força atrativa exercida por estes ímanes. Impõe-se então a questão: será que algum dia vamos chocar com Quimera?

Mafalda Pinto, 11.ºB

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