Cartas para Vig

Porto, 12 de março de 1853

   Queridos pais,

   Escrevo a pedir o vosso humilde perdão. Agora que sou capitão de um navio e giro uma próspera empresa de negócios, percebi que fugir de Vig não foi uma decisão consciente, mas uma resolução imponderada e impulsiva de um imaturo rapaz de catorze anos. Sete anos depois, olho para trás, e vejo um jovem sonhador a optar pela viagem “obscura e acidentada”, em vez do “percurso linear”, no porto seguro daqueles de quem mais sinto saudade.

   No dia em que embarquei para o vago desconhecido, cria que a minha carreira marítima estaria a um passo de mim, mas percebi que não era bem assim. Ao fim de longos dias, sendo mal tratado, sempre sentindo próximo o momento em que possuiria o meu barco, aportei numa cidade estrangeira. Ao deambular pelas íngremes ruelas enfeitadas de cultura e preenchidas de um idioma adventício, o meu olhar magnetizou-se no infinito e glauco manto de água que rodeava toda a costa, num andamento ténue, deixando no ar o cheiro de uma tarde de verão carregada pela brisa suave e o leve toque a um aroma rescendente a maresia. O amplo firmamento adamantino esfumava-se, dando lugar ao flamejante pôr do sol. Ao vislumbrar os áureos raios de luz iluminarem as várias casas que tingiam a cidade de cor, como o pincel colore a tela, uma estranha animação apoderou-se de mim, mas, ao fim de uns dias, todas essas emoções desvaneceram e cederam lugar à solidão e à longínqua saudade. Foi assim que conheci Hoyle, que me ofereceu a sua ajuda, depois de me encontrar perdido na escuridão da mente. Comprou-me papel e caneta e agora estou aqui a escrever-vos esta remota carta. Entretanto, tenho ajudado Hoyle nos seus negócios, tornando-me seu sócio e um grande empreendedor, gerindo, assim, a sua pequena fortuna.

   Não obstante o meu sucesso como operador comercial, não me sinto preenchido. Foi precisamente quando construí uma fortuna pessoal que nunca projetei que percebi que faltava a minha família e cidade-natal. Foi aí que percebi que queria voltar a Vig. Assim, peço humildemente o vosso perdão, pois, apesar da abundância de tudo o que vivi e construí, não me sinto rico no meu incompleto coração.

   Com amor e profunda nostalgia,

                                 Hans

P.S. Um dia voltarei a Vig, a bordo do meu veleiro, do qual serei capitão.

Maria Luís Veloso, 8.ºC

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