That’s when you know you found somebody really special… When you can just shut the fuck up for a minute and comfortably share silence.
Pulp Fiction
Tanto pode ser o silêncio ausência de linguagem como uma forma de comunicação. Da primeira aceção, é o par real exemplo. Na verdade, em Memorial do Convento são escassas as palavras que trocam e insignificantes as suas interações. São cavaleiro e dama, personagens de um exuberante baile que lhes é alheio, “nasceram para casar” e “para dar infantes à coroa portuguesa”. Mesmo este ato sexual é um “dever real e conjugal”, cuja monótona rotina anula o prazer da espontaneidade. No quarto em que apenas se juntam para o efeito, paira um “ar gélido” que nem o calor dos corpos consegue aquecer. Trata-se de uma relação protocolar, um não-amor. Mas é justamente quando este desconforto passa a conforto, que se sabe que se encontrou alguém verdadeiramente especial, segundo o filme de Tarantino. E se partilhar um minuto sem som já é um desafio, Baltasar e Blimunda “Por um hora ficaram os dois sentados, sem falar”. Não precisam de trocar palavras, quando a simbologia dos gestos já é tamanha – “a porta aberta para que Baltasar entrasse”, “o sangue da virgindade rasgada”, “a sofreguidão dela, a ânsia dele, enfim os corpos encontrados”. Compreende este homem o poder desta mulher, faz esta as vezes da mão esquerda do primeiro. Complementam-se, Sete-Sóis e Sete-Luas, como só dessa maneira devessem existir. Se, por um lado, “O cântaro está à espera da fonte” (que o digam suas altezas), por outro, não há hierarquias entre “ele com os seus ferros, ela com o seu lume e a sua água, ambos com a ardência que os lança sobre a enxerga”, “qual de baixo, qual de cima, nem parecem pessoas deste século”. “Há muitos modos de juntar um homem e uma mulher, mas, não sendo isto inventário nem vademeco de casamentar, fiquem registados apenas dois deles”.
Francisco Dias
02-04-2017